segunda-feira, 23 de julho de 2007



Plano Tecnológico da Educação

“O Plano Tecnológico da Educação, que vai ser apresentado hoje, prevê que cada sala de aula tenha um computador, uma impressora e um projector, num investimento que ultrapassa os 400 milhões de euros. (…)A partir do próximo ano lectivo, começará também a ser instalado um quadro interactivo por cada três salas de aula e generalizados o cartão electrónico do aluno e os sistemas de alarme e videovigilância (…)Outro dos objectivos, mas para 2010, é ter dois alunos por cada computador com ligação à Internet de banda larga.” Público, 23/07/2007 continuação

Estas brilhantes decisões recordam-me as soluções para todos os problemas encontradas pelos pais muito ocupados e ausentes: não se escuta, não se tentam resolver os problemas de base e tudo se resolve com o recurso a prendinhas, utilizando o dinheiro para comprar aquilo que se vê e pode promover a admiração de terceiros pelo investimento feito.
Para quem não conheça as escolas portuguesas, é preciso recordar que nas salas de aula falta espaço para instalar os 28 ou 30 alunos que constituem uma turma. Recordo, também, que nessas condições falta aos professores tempo para dar oportunidade a todos os alunos de intervir, questionar, praticar o que se aprendeu e recolher o feedback do trabalho realizado.
Sra. Ministra, recorda-se da dificuldade que teve em fazer-se ouvir no Parlamento, em Julho do ano passado, perante um grupo de adultos que, supostamente, quereriam ouvir o que tinha para dizer? (Foi vergonhoso, entendo que tenha apagado esse momento da sua memória) Imagine-se, pois, a transmitir um conteúdo programático (nem sempre interessante, há que admitir) perante 28 ou 30 crianças ou adolescentes que prefeririam estar a jogar à bola ou playstation…
Bem sei que se deve evitar a mera transmissão de conhecimentos mas nem sempre é possível fazer mil e um malabarismos que permitam aos 28 ou 30 alunos a fantástica descoberta do conhecimento.
Desnecessário será dizer que com esse elevado número de alunos é impossível apoiar os que têm mais dificuldades de aprendizagem. Mas “apoiar os alunos com dificuldades de aprendizagem” deve ser uma expressão que deixou de fazer sentido pois, além das alterações e cortes que houve ao nível do ensino especial, as aulas de apoio educativo e de recuperação deixaram de pertencer à componente lectiva dos docentes, fazendo, assim, supor que “aquilo” é só para encher horário e não carece de preparação prévia.
Mas já sabemos que no seu ministério e no seu governo, em geral, as pessoas não interessam, o que interessa mesmo é a tecnologia! Vamos a isso, então!
Sra. Ministra, em muitas escolas (inclusive em algumas referidas por si como exemplares) as impressoras existentes passam grande parte do ano sem tinteiro e as folhas utilizadas na impressão são compradas pelos docentes que também pagam muitas (ou a totalidade) das fotocópias que distribuem aos seus alunos. Há leitores de CDs que só funcionam com uma pedra sobre a tampa (!) e leitores de DVDs que estão eternamente avariados. Faltam cabos, fichas e tomadas para ligar os computadores, que permanecem mortos em cima das secretárias, e quando há uma pequena avaria não há dinheiro para mandar arranjar, ficando dependente da boa vontade dos amantes do bricolage e dos arranjinhos temporários que se conseguem. Os quadros interactivos não passam, muitas vezes, de elementos decorativos nas salas de aula porque para aprender a utilizá-los e fazer os respectivos flipcharts com os conteúdos a leccionar é preciso tempo, muito tempo. Tempo esse que o seu ministério entendeu que devia ser utilizado de forma mais nobre do que na actualização de conhecimentos e na preparação de aulas (pelos vistos uma actividade menor) e resolveu, por isso, presentear os professores com a sublime tarefa de “olhar pelos meninos”. Assim, o professor de História “toma conta dos meninos” em caso de ausência do colega de Ed. Física e o de Língua Portuguesa faz o mesmo com os do colega de Matemática, dizendo-lhes apenas “resolvam as actividades propostas pelo vosso professor e se tiverem dúvidas apresentem-nas quando ele voltar”.
Sou a favor da utilização de novas metodologias no ensino, inclusivamente das novas tecnologias, e penso que a Internet e o quadro interactivo podem ser utilizados com óptimos resultados. Mas o excesso assusta-me.
A escola tem de continuar a ser a escola e não deve querer assemelhar-se a uma nave espacial onde tudo é feito e controlado através de câmaras, botões, máquinas, cartões, códigos e chips. Uma sala de aula é, e deve continuar a ser, diferente de um cibercafé. As aulas tradicionais com papel, giz e quadro preto também fazem falta ao sistema de ensino e devem ser valorizadas na medida em que nos recordam que, mais do que a forma, o conteúdo é o fundamental. É, também, muito importante que se continuem a usar dicionários, enciclopédias, livros e revistas para a realização de trabalhos em vez de se promover a realização de trabalhos instantâneos: google – search – done!