O tempo que não passa…
É incrível que o tempo passe por nós sem que nos apercebamos e só reparemos que ele passou pela imagem que recebemos dos outros.
Lembro-me que quando era criança ouvia muitas vezes a minha avó, com idade já bastante avançada, afirmar “Aquela rapariga é da minha idade” ou “Há muito tempo que não via aquele rapaz”. Eu procurava-os com o olhar e surpreendia-me ao constatar que a rapariga ou o rapaz eram uma senhora ou um senhor com uma respeitável cabeleira branca, ou a ausência dela, e que tinha no rosto as marcas deixadas pelas experiências da vida.
Mais tarde, observei que também os meus pais se referiam da mesma forma a pessoas que, não tendo ainda uma idade tão avançada, também estavam longe de ser o que eu considerava um rapaz ou uma rapariga. Para mim era muito estranho que eles não compreendessem que as pessoas a quem se referiam eram adultos! Eram os pais dos meus amigos e colegas da escola e esses sim eram rapazes e raparigas… como eu!
Continuo a surpreender-me, mas já não com estes comentários, que pelo menos à minha avó não terei oportunidade de voltar a ouvir. Agora surpreendo-me quando encontro rapazes e raparigas que foram meus colegas e verifico que dos meninos que eu conheci não restou nada além da cor dos olhos, do cabelo e algum gesto ou expressão. Agora são independentes, trabalham, formaram as suas famílias e muitos têm filhos. Os rapazes e as raparigas que brincavam comigo ou faziam tropelias na escola, agora são o bancário, o enfermeiro, o dono do café, o vendedor, o professor, o polícia, o advogado, o desempregado, o dentista, o mecânico ou o psicólogo…
Colocaram de lado a bola, as bonecas e os carrinhos. Já não usam mochila e quando compram cadernos, lápis e borrachas são para os filhos e interessam-se pelo preço. Já não correm na rua ou quando o fazem não se divertem, fazem-no com um ar comprometido ou furioso e é apenas para não chegar tarde ao emprego ou para não perder o autocarro.
Se me ocorre, em alguma circunstância, ser atendida por algum deles que não me reconhece trata-me por “senhora” e já não me tentam subornar para que os ajude nos testes em troca de lápis de colorir ou de uma pedra de forma irregular. Também já não discutimos para decidir quem tem o pai mais forte, o irmão mais chato ou a professora mais bonita.
Sabem o valor do défice, o preço da gasolina e o valor da prestação da casa mas não sabem o nome de todas as bonecas, quantos carros vermelhos passaram na rua na última meia hora nem quantos tinham matrículas com capicuas. Já não dizem ser o Homem-Aranha, a Super-Mulher ou o Batman. Alguns até esqueceram tudo o que queriam ser de tão ocupados que estão e se alguém lhes lembrar, provavelmente, vão dizer que é um disparate, uma idiotice de quem não cresceu e vive preso a recordações de infância.
Ganharam idade, ganharam poder, há quem diga que ganharam juízo. Tomam decisões, resolvem problemas, dão ordens fundamentadas por vezes, outras vezes apenas “porque sim” ou “porque não” como as que detestavam receber quando eram crianças. Alguns aprenderam técnicas infalíveis na arte de negociar ou seduzir e têm sucesso numa ou em ambas. Mas perderam a capacidade de se encantarem com uma gota teimosa que entra pela janela mal calafetada, com as poças de água nos dias de chuva ou com a lagarta verde que se passeia vagarosamente na folha de couve.
Também eu cresci. Também eu não sou a menina que era… Somos todos adultos, mas para mim são, e continuarão a ser, o rapaz ou a rapariga que brincava no recreio ou no jardim. E, mesmo com o actual cabelo grisalho de alguns e com o futuro cabelo branco e movimento condicionado de todos, vê-los-ei sempre com um sorriso no olhar, a brincar e a correr pela vida fora.
É incrível que o tempo passe por nós sem que nos apercebamos e só reparemos que ele passou pela imagem que recebemos dos outros.
Lembro-me que quando era criança ouvia muitas vezes a minha avó, com idade já bastante avançada, afirmar “Aquela rapariga é da minha idade” ou “Há muito tempo que não via aquele rapaz”. Eu procurava-os com o olhar e surpreendia-me ao constatar que a rapariga ou o rapaz eram uma senhora ou um senhor com uma respeitável cabeleira branca, ou a ausência dela, e que tinha no rosto as marcas deixadas pelas experiências da vida.
Mais tarde, observei que também os meus pais se referiam da mesma forma a pessoas que, não tendo ainda uma idade tão avançada, também estavam longe de ser o que eu considerava um rapaz ou uma rapariga. Para mim era muito estranho que eles não compreendessem que as pessoas a quem se referiam eram adultos! Eram os pais dos meus amigos e colegas da escola e esses sim eram rapazes e raparigas… como eu!
Continuo a surpreender-me, mas já não com estes comentários, que pelo menos à minha avó não terei oportunidade de voltar a ouvir. Agora surpreendo-me quando encontro rapazes e raparigas que foram meus colegas e verifico que dos meninos que eu conheci não restou nada além da cor dos olhos, do cabelo e algum gesto ou expressão. Agora são independentes, trabalham, formaram as suas famílias e muitos têm filhos. Os rapazes e as raparigas que brincavam comigo ou faziam tropelias na escola, agora são o bancário, o enfermeiro, o dono do café, o vendedor, o professor, o polícia, o advogado, o desempregado, o dentista, o mecânico ou o psicólogo…
Colocaram de lado a bola, as bonecas e os carrinhos. Já não usam mochila e quando compram cadernos, lápis e borrachas são para os filhos e interessam-se pelo preço. Já não correm na rua ou quando o fazem não se divertem, fazem-no com um ar comprometido ou furioso e é apenas para não chegar tarde ao emprego ou para não perder o autocarro.
Se me ocorre, em alguma circunstância, ser atendida por algum deles que não me reconhece trata-me por “senhora” e já não me tentam subornar para que os ajude nos testes em troca de lápis de colorir ou de uma pedra de forma irregular. Também já não discutimos para decidir quem tem o pai mais forte, o irmão mais chato ou a professora mais bonita.
Sabem o valor do défice, o preço da gasolina e o valor da prestação da casa mas não sabem o nome de todas as bonecas, quantos carros vermelhos passaram na rua na última meia hora nem quantos tinham matrículas com capicuas. Já não dizem ser o Homem-Aranha, a Super-Mulher ou o Batman. Alguns até esqueceram tudo o que queriam ser de tão ocupados que estão e se alguém lhes lembrar, provavelmente, vão dizer que é um disparate, uma idiotice de quem não cresceu e vive preso a recordações de infância.
Ganharam idade, ganharam poder, há quem diga que ganharam juízo. Tomam decisões, resolvem problemas, dão ordens fundamentadas por vezes, outras vezes apenas “porque sim” ou “porque não” como as que detestavam receber quando eram crianças. Alguns aprenderam técnicas infalíveis na arte de negociar ou seduzir e têm sucesso numa ou em ambas. Mas perderam a capacidade de se encantarem com uma gota teimosa que entra pela janela mal calafetada, com as poças de água nos dias de chuva ou com a lagarta verde que se passeia vagarosamente na folha de couve.
Também eu cresci. Também eu não sou a menina que era… Somos todos adultos, mas para mim são, e continuarão a ser, o rapaz ou a rapariga que brincava no recreio ou no jardim. E, mesmo com o actual cabelo grisalho de alguns e com o futuro cabelo branco e movimento condicionado de todos, vê-los-ei sempre com um sorriso no olhar, a brincar e a correr pela vida fora.